quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Mamãe

Uma vez vi uma frase que dizia, se bem me lembro, que quando você acha que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas. E eu diria que, nesse estágio, no exato momento da mudança, você acaba vendo ali, bem à sua frente, a reformulação de todo o seu futuro com uma simples escolha que se faça.

Diante dessa imensa confusão, o que eu consigo observar são as coisas que, mesmo entrelaçadas a tantas outras, não devem ser mudadas, simplesmente porque são essenciais. O Caio Fernando de Abreu já falava que depois das tempestades, o que fica em nós é mais verdadeiro e essencial. Falo das coisas que têm significado. E que nem sempre abrimos os olhos para observá-las.

Ontem eu briguei com minha mãe. Eu, no alto da minha "personalidade", falava em cima de um pedestal imaginário que me fazia me sentir muito mais articulada que ela nos argumentos. Daí, enquanto eu ainda tinha energia de sobra para uma discussão infindável, ela simplesmente solta a frase nocauteadora: "Eu só quero o seu bem".

Ela saiu e eu chorei. Assim, baixinho, para ela não ter tanta certeza de que conseguiu me atingir, bem no alvo. Fiquei pensando nas pessoas que me amam. E o quanto eu não lhes dou o valor que elas merecem. Às vezes dedicamos afeto instantâneo a um monte de gente que acabamos de conhecer, mas não somos capazes de dar um afago naquelas pessoas que nos suportam sempre, simplesmente porque nos amam.

O mais intrigante é ver o porquê de querermos ser amados. Fazemos tudo o que está ao nosso alcance para que o outro descubra nossos jardins secretos, damos a falsa impressão de sermos indivíduos dotados de uma espécie de aura de perfeição, para que o outro nos admire, nos enobreça, nos coloque em um plano dos 'dignos de amor'.

No entanto, acredito que o sentimento mais verdadeiro se coloca muito além de todo esse cenário. Minha mãe tem um milhão de defeitos. Mas eu daria minha vida por ela. Deve ser isso o chamado "amor". Acredito mais nos pequenos gestos do que nas grandes frases. Amar, para mim, é deixar meu ego de lado e lavar os pratos sujos da pia, porque meu pai é metódico e sofre quando vê a louça entulhada. Eu não estou lavando os pratos, eu estou amando meu pai.

Acho que essa 'prova dos nove' das atitudes deve guiar nossas condutas. Acho que devemos prestar mais atenção naquelas coisas aparentemente banais, que as pessoas fazem por nós. Elas carregam a profundidade do sentimento. Fico observando as atitudes das pessoas que estão ao meu redor a partir dessa perspectiva. Muitas me confessam indiferença nos gestos, e costumo prestar atenção nisso. Outras me mostram afeto sem falar uma palavra sequer. Cabe a mim, portanto, mensurar cada um dos lados e atribuir o seu valor.

Aprendi, com aquela frase da minha mãe, que devemos valorizar as pessoas que nos querem bem. Só porque ela é carregada de humanidade precária, e por isso mesmo, falível tantas vezes, não significa que seu amor por mim não seja muito mais divino que humano. Só porque ela já me ama, não significa que não preciso mais tratá-la com toda ternura que ela merece. Porque, já dizia Exupèrry, no Pequeno Príncipe, que "foi o tempo que dedicastes à tua rosa que a fez tão importante". Por isso, vou regar as minhas rosas, que, por tantas vezes, transformam-se em cactos diante da minha aridez, do meu deserto.
A Adélia Prado, do alto da sua sensibilidade, sintetiza isso tudo de forma ímpar, no poema 'Ensinamento":

Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café, deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.

4 comentários:

Camila Carol disse...

Lindo post amiga!

E obrigada, pela msgem de ontem...

Tu não existe tb...hehehe

Beijo!

Lis disse...

Oi

só pra dizer q seu blog é muito legal

=)

Unknown disse...

Embora um tanto atrasada, não poderia deixar passar a oportunidade de dizer que esse texto tá maravilhoso Vivi!! Me tocou mesmo. Por favoorr..não pare de escrever viu, embora minhas visitas não sejam frequentes, seus textos não permitem que eu fique muito tempo sem lê-los :)
Bjinho

Ingrid

Unknown disse...

Vivi...perfeito...bjo!!! Sempre estarei por aqui, me impressionandp contigo - pra variar....