segunda-feira, 1 de abril de 2013

Uma rede na varanda

Ufa! Depois de mais de 40 dias de parto, hoje é o primeiro dia em que observo a casa em silêncio. Levi está dormindo, meu marido viajando, minha ajudante de folga, minha mãe em uma reunião, minha gata contemplando o luar. Estou "sozinha" e resolvi escrever aqui depois de ter me situado no novo lugar em que me encontro hoje: o de mãe.

Confesso que meu parto, como já contei no post anterior, foi traumático e bem difícil. Talvez por isso eu tenha saído da maternidade assustada e com medo de qualquer coisa que eu pudesse fazer. Na minha cabeça, eu tinha feito alguma coisa muito errada na gravidez para ter perdido líquido amniótico e ter gerado toda aquela confusão, e tive medo de fazer lambança de novo. Quando cheguei em casa, eu não sabia o que fazer. Não apenas o que fazer diante do choro de um bebê, mas eu não sabia fazer absolutamente nada com a minha própria vida. É desafiador e arriscado dizer isso, mas me senti completamente sem chão e sem rumo diante daquele cenário que a mim se apresentava sem rodeios. Todo o panorama me exigia postura, segurança e equilíbrio, e tudo o que tinha restado de mim após o parto era exatamente o contrário desses sentimentos. Me arrependi de ter me metido naquilo, tive a certeza de que eu não havia nascido para ser mãe a cada choro desesperado de Levi, e tive vontade de correr pelada no meio da rua, de me internar numa clínica psiquiátrica, tive vontade de sumir. Enfim, eu tive a certeza absoluta de que eu não ia dar conta de nada daquilo. 

Achava que eu era a  única louca-psicótica-depressiva que não se sentia feliz por ser mãe, por achar muuuuito, mas muito difícil mesmo amamentar, que não estava no estado pleno de felicidade que todas diziam sentir após gerar um filho. A cada vez que eu sentia essa tristeza, eu chorava, chorava e chorava, sem entender o porquê de eu ter desejado um filho desde a minha infância e não estar feliz com ele nos braços. Me sentia culpada e com vergonha de falar isso para qualquer pessoa. Até que eu não aguentei e decidi pedir ajuda. Comecei a me confessar perante todas as mulheres que eu conhecia e sabe qual foi minha surpresa? Todas diziam que sentiram a mesma coisa...como assim, mesma coisa? "Vc também teve vontade de pular do prédio?" "Sim", "Sim", e "Sim". Eu não acreditava que, mesmo as mulheres 'normais' que não são loucas como eu, também tiveram seus momentos de tristeza, de desespero e de falta de esperança logo após gerar um filho. Ninguém havia me dito nada antes. Todos diziam apenas que ser mãe era maravilhoso, que amavam o filho mais do que tudo, que era uma felicidade só. O pouco que diziam de negativo era de que nunca mais iríamos dormir, e só. 

Ninguém me falou do outro lado da história. Que além de não dormir, a gente não iria mais comer, tomar banho, ir ao banheiro, escovar os dentes, o cabelo. Que a gente ia precisar de muita ajuda para que o bebê pegasse o seio corretamente, e que quando ele finalmente o fizesse, a dor seria quase insuportável. Eu, no meu mundo cor-de-rosa (aliás, azul), achava que ia amamentar livremente e sempre, até muito mais que os seis meses, porque sempre gostei de uma coisa natureba e achava que tudo seria "naturalmente" fácil. Tudo foi "naturalmente" difícil! Meu filho não tinha forças de sugar o seio, meu leite era abundante e meus seios "empedraram"; quando ele aprendeu a sugar, meu leite secou; quando meu leite voltou, ele começou a ter refluxo e a chorar para não mamar; quando pensei que o problema era só o refluxo, descobri um sopro no coração; quando me desesperei pensando que ele não iria jogar futebol, descobri que muitos bebês tem sopro e que isso era comum e não lhe traria prejuízo; que havia horas em que ele chorava e eu não entendia nada do que ele queria; que na maior parte do tempo eu me sentia esgotada e sem forças... Os primeiros quinze dias para mim foram simplesmente devastadores. Além de todas as dificuldades, adquiri uma "síndrome do músculo piriforme" que não me deixava andar por um período do dia ou da noite (ainda hoje tenho as crises mais agudas, mas estou me tratando). Eu me sentia o cocô do cavalo do bandido, me sentia a pior mãe do mundo.

Mas os dias foram passando, e o "blues puerperal" também. O primeiro mês como mãe passou. E com ele o medo foi dando lugar à esperança, a angústia foi perdendo espaço para a respiração, e fui começando a "tomar pé" no meu novo lugar. Não sei explicar como aconteceu uma mudança, mas lentamente tudo foi se encaixando. Talvez os hormônios tenham voltado ao lugar, ou o remédio homeopático que estou tomando ou a acupuntura para a dor no quadril tenha ajudado, ou quem sabe, talvez seja porque Levi a cada dia está mais lindo, mas o fato é que nessas últimas semanas tenho sentido um amor pelo meu filho que não cabe em mim. Todo dia olho para os olhinhos dele e fico me perguntando como eu pude gerar um ser tão perfeito e tão gracioso, como Deus pôde ter me presenteado com um filho...um filho! Uma continuação de mim, do pai dele, a concretização do amor que sentimos um pelo outro...não sei explicar e se soubesse, não conseguiria definir com palavras. O que sei é que hoje eu realmente entendo porque ninguém me disse que tudo seria tão desesperador no começo (e como continua sendo tantas vezes) : simplesmente a gente esquece do tamanho da dificuldade ao perceber a graça que é gerar um ser e vê-lo crescer. Nunca, em toda minha vida, me senti tão feliz e tão realizada. Não imaginava que pudesse ser assim, tão bonito que chega a doer. É claro que tudo ainda é novo, cansativo, e ainda não durmo nem faço outra coisa que não seja cuidar dele. Mas, por mais contraditório que seja, é um cansaço que me restaura. Parece resgatar tudo o que é bom em mim. 

Hoje, mais uma vez balançando Levi na rede, comecei a cantar aquela música "Eu queria ter na vida simplesmente um lugar de mato verde, pra plantar e pra colher...ter uma casinha branca de varanda, um quintal e uma janela só pra ver o sol nascer...". Aí prestei atenção na letra da música, e mudei a  composição...Comecei a cantar: "Eu só quis ter na vida simplesmente um lugar como esse, pra amar e pra viver...ter uma redinha branca na varanda, um marido e um filhote, só pra ver o amor crescer..." olhei pro céu e agradeci emocionada a Deus por estar vivendo aquele momento. Senti como se a felicidade estivesse ali, em pé, nos embalando. Olhei para o meu filho e ele sorriu pra mim. Sorri de volta e de repente, o mundo começou a fazer sentido. ;)