terça-feira, 24 de julho de 2012

Capitães da Areia


No último domingo, o "Fantástico" exibiu uma reportagem sobre as precárias condições dos centros de internação para menores em vários lugares do País (Reportagem aqui!). A cada cena em que crianças e adolescentes infratores eram tratados como lixo, em condições animalescas, meu coração se condoía. Eu não sabia o que aqueles pobres diabos tinham feito de errado, mas eu sabia que o que o Estado fazia com eles era, com certeza, errado. Se Foucault pudesse ver a reportagem talvez a usasse como paradoxo do seu "Vigiar e Punir". No caso do Brasil, o livro mais adequado seria "Prender, Sofrer e Soltar". A diferença dos títulos talvez reflita a diferença entre os dois sistemas. No entanto, não quero falar sobre o sistema carcerário brasileiro. Quero falar sobre as reações que as pessoas tem ao ver "ladrões" ( e não "seres humanos") sofrerem as maiores atrocidades à vista de todos: elas vibram.

Uma pseudo-escritora comentou em uma rede social que tinha adorado a reportagem, pois não tinha pena nenhuma de adolescentes que "podiam trabalhar e escolheram roubar". Que eles deveriam apodrecer na cadeia e que nenhum castigo para eles era suficiente. E o pior, centenas de pessoas "curtiram" o comentário da moça e reforçavam o coro de que todos aqueles adolescentes deveriam ser mortos, assim como as pessoas dos "Direitos Humanos" que os defendem.

Eu vi tudo isso, e fiquei pensando em todos os horrores sem explicação que acontecem no mundo e que todo mundo fica estupefato: onde estão os valores dessas pessoas? Porque não é possível que alguém que tenha o mínimo respeito pela dor do outro fique feliz por ver um adolescente infrator ser espancado todos os dias, ter de fazer suas necessidades nas embalagens em que come por não existir banheiro, achar que é apenas "uma escolha" de uma criança pobre tentar ganhar a vida no tráfico.

O que me assusta é ver que essas pessoas são a maioria do mundo. O que me intriga é ver que a vida do nosso semelhante passou a ser relativizada, tanto pelos criminosos, como pelos "cidadãos de bem". Ora, se é crime não se importar com a dor alheia, todos então são criminosos. Eles se equiparam com a mesma insensibilidade.

Agindo como se tivéssemos "inimigos" e colocando esse rótulo nos infratores, nos aproximamos- e muito- do Nazismo e de todas as suas consequencias nefastas. Antes que me acusem de "defensora dos presos", digo que não compartilho da indulgência tantas vezes vistas no Código Penal. Até porque tive um tio que foi assassinado aos 23 anos de idade, cujo assassino foi absolvido. Para mim, um criminoso tem de ser punido exemplarmente. Mas meu ideal de punição não é ultrajante, que ao invés de educação, desenvolve-se pela humilhação e degradação. Acho que punir é fazer com que o infrator se arrependa do que fez, em que ele possa ver que o prejuízo foi maior que o benefício. Nas prisões brasileiras, essa lógica é completamente distorcida. Enfim, o que me assusta mais do que presídios, é ver a sociedade aplaudi-los pela sua precariedade.

Mas, o que podemos esperar de uma sociedade que dá audiência a um programa como "Pânico" e "A Fazenda"? Como falava Zigmunt Bauman, vivemos na "era líquida". Líquida de valores, de ideais, de sentimentos. Tudo se tornou fluido, nada parece concreto. E valores são sólidos. Valor pela vida, pelo menos, deveria ser escrito em pedra, mas para a maioria das pessoas, até este valor parece ser escrito na areia.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

terça-feira, 17 de julho de 2012

MANIA DE EXPLICAÇÃO
(Adriana Falcão)


Era uma menina que gostava de inventar uma explicação para cada coisa.

Explicação é uma frase que se acha mais importante do que a palavra.
As pessoas até se irritavam, irritação é um alarme de carro que dispara bem no meio de seu peito, com aquela menina explicando o tempo todo o que a população inteira já sabia. Quando ela se dava conta, todo mundo tinha ido embora. Então ela ficava lá, explicando, sozinha.
Solidão é uma ilha com saudade de barco.
Saudade é quando o momento tenta fugir da lembrança pra acontecer de novo e não consegue.
Lembrança é quando, mesmo sem autorização, seu pensamento reapresenta um capítulo.
Autorização é quando a coisa é tão importante que só dizer "eu deixo" é pouco.
Pouco é menos da metade.
Muito é quando os dedos da mão não são suficientes.
Desespero são dez milhões de fogareiros acesos dentro de sua cabeça.
Angústia é um nó muito apertado bem no meio do sossego.
Agonia é quando o maestro de você se perde completamente. Preocupação é uma cola que não deixa o que não aconteceu ainda sair de seu pensamento.
Indecisão é quando você sabe muito bem o que quer mas acha que devia querer outra coisa.
Certeza é quando a idéia cansa de procurar e pára.
Intuição é quando seu coração dá um pulinho no futuro e volta rápido.
Pressentimento é quando passa em você o trailer de um filme que pode ser que nem exista.
Renúncia é um não que não queria ser ele.
Sucesso é quando você faz o que sempre fez só que todo mundo percebe.
Vaidade é um espelho onisciente, onipotente e onipresente. Vergonha é um pano preto que você quer pra se cobrir naquela hora.
Orgulho é uma guarita entre você e o da frente.
Ansiedade é quando faltam cinco minutos sempre para o que quer que seja.
Indiferença é quando os minutos não se interessam por nada especialmente.
Interesse é um ponto de exclamação ou de interrogação no final do sentimento.
Sentimento é a língua que o coração usa quando precisa mandar algum recado.
Raiva é quando o cachorro que mora em você mostra os dentes.
Tristeza é uma mão gigante que aperta seu coração.
Alegria é um bloco de Carnaval que não liga se não é fevereiro.
Felicidade é um agora que não tem pressa nenhuma.
Amizade é quando você não faz questão de você e se empresta pros outros.
Decepção é quando você risca em algo ou em alguém um xis preto ou vermelho.
Desilusão é quando anoitece em você contra a vontade do dia.
Culpa é quando você cisma que podia ter feito diferente, mas, geralmente, não podia.
Perdão é quando o Natal acontece em maio, por exemplo.
Desculpa é uma frase que pretende ser um beijo.
Excitação é quando os beijos estão desatinados pra sair de sua boca depressa.
Desatino é um desataque de prudência.
Prudência é um buraco de fechadura na porta do tempo.
Lucidez é um acesso de loucura ao contrário.
Razão é quando o cuidado aproveita que a emoção está dormindo e assume o mandato.
Emoção é um tango que ainda não foi feito.
Ainda é quando a vontade está no meio do caminho.
Vontade é um desejo que cisma que você é a casa dele.
Desejo é uma boca com sede.
Paixão é quando apesar da placa "perigo" o desejo vai e entra.
Amor é quando a paixão não tem outro compromisso marcado. Não. Amor é um exagero... Também não. É um desadoro... Uma batelada? Um enxame, um dilúvio, um mundaréu, uma insanidade, um destempero, um despropósito, um descontrole, uma necessidade, um desapego? Talvez porque não tivesse sentido, talvez porque não houvesse explicação, esse negócio de amor ela não sabia explicar, a menina.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Milagres Reais

Assisti ao filme "A Felicidade Não Se Compra" nesses últimos dias. A película é de 1946, mas tem uma mensagem que ultrapassa qualquer marca de tempo: "Nunca se é um fracasso quando se tem amigos". O filme foi muito especial pra mim, pois o dinheiro que o personagem precisava desesperadamente era o mesmo valor que conseguimos arrecadar para Jamyle: R$8.000,00 (Oito mil reais). Mais precisamente, conseguimos arrecadar até agora R$8.200,00, cuja transferência para conta de Amaury foi feita ontem, juntamente com a lista de doadores, incluídos os anônimos. Além da quantia, tivemos promessas de passagens e de ajuda, até mesmo do Ministério Público!

Os pais de Jamyle ainda estão sem acreditar em tudo o que aconteceu nesses últimos dias. Eles disseram que quando o caso dela apareceu na televisão não receberam nem 10% da ajuda de agora. Isso me faz a pessoa mais feliz do mundo hoje, justamente porque sei que nossa capacidade de mudar a vida de alguém para melhor é real, concreta, e só depende da nossa iniciativa. Gostaria de agradecer a Deus também por ele ter dado inteligência a quem criou a internet! O blog, o facebook e as transferências on line fizeram com que o tratamento de Jamyle pudesse ser real. Graças a vocês...


Não tenho palavras para agradecer a cada pessoa que teve o coração tocado e que efetivamente, agiu. De forma concreta, honesta, cheia de compaixão e amor, cada um que doou  teve um gesto grandioso de caridade, de sensibilidade, de amor ao próximo. A cada uma dessas pessoas, o meu mais sincero agradecimento, a minha gratidão eterna e a minha oração para que a vida de vocês seja repleta de acontecimentos felizes. Cada uma dessas pessoas merece, de verdade, que o bem que fizeram volte pra elas, e eu tenho certeza absoluta que isso vai acontecer (se já não aconteceu)...

Obrigada, obrigada, mil vezes obrigada a cada um. Agora, resta-nos esperar que o Hospital diga a data da viagem para que possamos torcer, todos juntos, por uma menina que já mostrou o quanto é especial. Especial, sobretudo, por ter amigos como vocês. ;)