quinta-feira, 11 de outubro de 2012

O Sapo e a Baleia

Era uma vez uma baleia, a "Jubarte", que adorava nadar nas profundezas. Desde pequena, enquanto as outras pequenas baleias não gostavam de passar muito tempo debaixo d´água, ela tentava controlar ao máximo a respiração para só subir para a superfície para não morrer. Afinal, como a mãe dela gostava de advertir, baleias são mamíferos, e não peixes, portanto, era necessário respirar fora da água.
A pequena Jubarte não entendia e se revoltava por sua condição precária, segundo ela. O oceano era uma imensidão de mistérios que ela deveria desvendar. Não aceitava sua falta de guelras, como as que os peixes tinham, que o faziam nadar por todo o fundo do mar sem precisarem interromper sua busca apenas para respirar.

Jubarte foi crescendo sentindo-se inadequada no meio em que vivia. Não gostava da superfície, do raso, do trivial. Não comia peixes, não pela inveja que eles a causavam, mas porque tinha dó. Não conseguia entender como as outras baleias apenas abriam a boca, destruíam milhares de vidas e continuavam felizes. Só comia plâncton. Seu Pai dizia sempre que era a lei da natureza. E explicava a cadeia alimentar marinha, o ecossistema aquático e dizia o quanto era importante cumprir o papel que lhes era dado. Ainda assim, ela não aceitava.

E justamente por não entender tantas regras, Jubarte foi criando as suas próprias. E foi sendo deixada de lado pelas baleias da sua idade, afinal, era complicado demais ser amiga de Jubarte. Sempre falando de dúvidas, de sentimentos, dos filmes em que as baleias eram heroínas e até amigas dos humanos. Por isso, só tinha poucos amigos, dentre eles a  baleia Azul, a peixe Espada, e a peixe Arraia. As três amigas de Jubarte eram curiosas como ela, mas a baleia Azul não entendia muito o por quê dela não gostar da vida que tinha, afinal as baleias viviam como tinham de viver, sem precisar entender muito. Ela era prática, mas gostava de Jubarte. Eram como Dom Quixote e Sancho Pança ( no livro de Miguel de Cervantes há uma frase que lembra bem a diferença da visão dos dois. É quando Sancho diz: "mas sabe Deus se eu não achava melhor que Vossa Mercê se queixasse só quando lhe doesse alguma coisa.").




Arraia e Espada entendiam melhor Jubarte, porque era como se Jubarte fosse realmente, um peixe e não uma baleia. As três tinham afinidade suficiente para conversarem sem se espantar com as loucuras da outra. Azul escutava e achava tudo uma grande loucura, principalmente quando Jubarte decidiu viajar. Decidiu impulsiva e instintivamente, como era de seu feitio. Combinou com as amigas para, caso não voltasse em um mês, irem procurá-la. Jubarte queria mais do que ver as mesmas coisas sempre. Queria ver o mar de uma perspectiva ainda mais profunda, sem ter de explicar sempre a razão do seu querer.

Nadou quando todos dormiam. Foi-se maravilhando com cada paisagem que via, cada ser vivo que nunca tinha visto, e cada dia era diferente do outro. Até que teve saudades de casa. Saudades da sua família, dos seus amigos, do pequeno peixinho Barrigudo, para quem ela contava historinhas. Ficou triste. Comeu todo o plâncton que havia, mas ainda sentia fome. Decidiu voltar para casa. Apesar de maravilhoso, o fundo do mar era um lugar muito solitário. E apesar do seu espírito introspectivo, ela gostava de estar perto dos seus semelhantes, era como se eles curassem sua natureza de ser só. Subiu à superfície, enfim, para respirar e voltar para casa.

Mas eis, que, ao subir, se deu conta de que havia ultrapassado a divisa do rio com o mar. Estava num rio! Ficou angustiada em não saber como voltar, haveria de esperar a maré encher novamente e poder escapar dali. Sentiu-se vulnerável e com medo. Até que um sapo apareceu. O sapo não lavava o pé, nem o corpo, odiava água. Chamavam-no de Papo, e não de sapo, porque adorava conversar. E não foi diferente com Jubarte. Ao vê-la, achou  que a beleza do mundo inteiro havia pousado naquela baleia. Foi, então, conversar com ela, apesar de ela estar muito mergulhada na água. Jubarte achou aquele Sapo muito estranho e feioso. Mas logo que começaram a conversar, Jubarte riu. E continuou rindo o tempo todo com o Papo do sapo. Gostou dele e decidiu ficar ali por uns dias.

Descobriu que Papo só gostava da superfície. Era exatamente o contrário dela: ele como anfíbio, tinha a obrigação de mergulhar na água para continuar respirando. E odiava. Odiava porque não queria mergulhar no desconhecido. A superfície era um lugar muito bom, ele tinha muitos amigos terrestres, vivia pulando de pedra em pedra, de casa em casa, e ia vivendo sem precisar entender muita coisa. Papo gostava do vento, da leveza, não da densidade, da profundidade. Para quê? O fundo do mar deve ser um lugar triste, sem luz e sem ar, dizia. Jubarte começou a entender pela primeira vez, que talvez a vida não fosse tão misteriosa como ela pensava. A vida podia ser simples. E foi, sem querer, se apaixonando por Papo. Estar com ele era como se estar o tempo todo de férias. E isso era algo que ela jamais tinha experimentado.

Foi gostando do brilho do sol na água, de respirar melhor na superfície. Mas não conseguia ficar muito tempo ali. Foi falando para o Sapo das maravilhas das profundezas, da beleza oculta em cada paisagem que via, do que tinha visto e vivido até ali. Papo ficou encantado. Aquilo parecia tão bonito que ele tinha medo de que passasse pela vida sem nunca ter mergulhado no mar. Era uma loucura, mas ele queria viver isso com Jubarte. Sua mãe ficou louca. Como é que ele queria ir embora com aquela imensa baleia? Ele iria morrer!
Mas o amor dos dois foi suficiente para chegarem a um acordo. Papo teria que mergulhar o máximo que podia e Jubarte teria que subir ao seu máximo também. E assim aconteceu. Todos do mar e da terra foram convidados a ver o encontro daqueles que não apenas se atraíram, mas se equilibraram em seus opostos. O casamento foi uma grande festa de encontro entre o rio e o mar! 

Papo e Jubarte foram viver numa lagoa, profunda em um trecho e rasa em outro. Aprenderam a conviver nos dois lugares, mas sem perder o que cada um amava. E assim viveram felizes, até que um peixinho pequeno chegou e quis fazer companhia aos dois. Chamava-se LEVI.
E Papo e Jubarte viveram felizes para sempre, pois descobriram o que era "Amor".