segunda-feira, 25 de maio de 2009

Eu ainda nem tinha escrito aqui sobre minha recepção da viagem. Todo mundo aterrorizado, ninguém apertando minha mão, gente que impediu minha irmã de se aproximar das pessoas, professor que não deixou minha mãe fazer hidroginástica. Tudo por causa de uma mídia maldita que escolhe aterrorizar pessoas só por causa de um lote de mexicanos gripados espirrando. Em Nova York não se via nada disso, na TV só passava casos de crianças desaparecidas, com apresentadores do tipo "Datena". Acho uma grande besteira essa histeria toda em torno de uma gripe, para desespero dos crédulos-hipocondríacos de plantão. O que eu realmente gostaria que fosse classificada como "pandemia" é a fome, a Aids infectando a África e o mundo, e tantas outras calamidades que já caíram no "costume". A televisão é um quarto poder tão sórdido que me revolta saber que o Nordeste, pobre como sempre, não recebe 1/5 das doações que um estado tão rico e tão menos afetado como Santa Catarina recebeu quando vítima das enchentes. Também me revolta não ver as mães dos meninos assassinados por um deputado bandido terem qualquer espaço na tela para denunciar a sordidez do caso. Mas, como a TV é fomentadora da apatia, muita gente deve dizer:"é assim mesmo" e continuar sentada no sofá. Sei que não me aproximo do chinelo do Che ou da Olga, mas ainda encaro o desligar a tv como um gesto revolucionário. E como o próprio Ernesto Guevara já dizia : "se você é capaz de tremer de indignação a cada vez que se comete uma injustiça no mundo, então somos companheiros."

domingo, 24 de maio de 2009

O poema "Versos" da Cecília Meireles, é um dos meus prediletos. Mas nunca ele me pareceu tão simples de entender e tão profundo, certeiro. E eu acabo descobrindo que a poesia cura.


"Permita que eu feche os meus olhos, pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora, e cantando pus-me a esperar-te.
Permita que agora emudeça: que me conforme em ser sozinho.
Há uma doce luz no silêncio, e a dor é de origem divina.
Permita que eu volte o meu rosto para um céu maior que este mundo, e aprenda a ser dócil no sonho como as estrelas no seu rumo.
Temos um medo:
Acabar.
Não vês que acabamos todo o dia.
Que morremos no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.

Que nos renovamos todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.

Que somos sempre outro.
Que somos sempre o mesmo.

Que morreremos por idades imensas.
Até não termos medo de morrer.
E então seremos eternos”

sábado, 23 de maio de 2009

Em dias de TPM, me sinto a pessoa mais sozinha do mundo. Chorando e sem ter ninguém do lado, perguntei a Deus baixinho se era verdade que Ele estava perto, porque minha solidão ecoava, dominante, pelo quarto. Descrédula, adormeci. Até que lá pelas 3h30 da manhã, em que se escutava apenas o barulho da chuva, algo se enroscou nos meus pés, e um toque áspero começou a tentar dizer: "você não está só". Era minha gata, Sofia, lambendo meu dedão e tentando ser carinhosa comigo, o que, para quem conhece felinos, sabe que não é muito usual. Dormimos pouco, mas suficiente para nos fazer esquecer a noite e esperar pelo dia. Sorri com aquela cena, mais que isso,com aquele vestígio deixado por Ele, como pista para que o desejo de procurá-lo não terminasse... e acordei lembrando de uma frase que Fábio de Melo certa vez citou, atribuída ao místico São João da Cruz:

" O que podemos conhecer de Deus são as pegadas da sua ausência."

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar
...
Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização
Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você

(Chico Buarque)

domingo, 17 de maio de 2009

Sobre o amor e outras histórias.


Eu sei que eu devia escrever um post sobre a viagem que fiz, que me rendeu fotos e lembranças lindas, e eu ia fazer isso mesmo, como tinha até falado para a Chris, mas eu sinto que é até mesmo um dever falar um pouco do que ando percebendo nos últimos dias. Concluí hoje, depois de conversar com Cami:

"Nós estamos perdendo a capacidade de amar."

E isso é perigoso. Quase cruel.

Percebi isso quando terminei o maravilhoso "A menina que roubava livros" (presente de Vanusa, obg amiga!). Chorei do meio ao fim do livro, diante do terror da guerra e do holocausto. Ainda sob efeito do livro, pensei no legado deixado não apenas por Auschiwitz ,Hiroshima, Vietnã, Afeganistão e tantos outros. Pensei mais perto, no que a gente anda fazendo pra disseminar tanta coisa ruim no mundo e sufocar bons sentimentos. E todo esse ódio mundial começa com falta de amor. Simplista e piegas? Pode ser. E é justamente isso que "deve" ser. Temos que voltar à pieguice, pelo bem da humanidade.

Já me explico.
Há algum tempo atrás, diante de uma desilusão amorosa qualquer, fui seduzida a adotar a personalidade do "tô nem aí". Cortei cabelo- como sempre acontece com as mulheres- malhei, estudei, consegui emprego, e como dizem "dei a volta por cima"( essa história inclusive é letra de uma música brega...). Lembro que eu dizia: "De hoje em diante, vou agir como homem". Tentei, em vão, dispensar sentimentos, e tentei também tornar pessoas descartáveis. Mas o plano durou pouco, quem sabe um final-de-semana, e desisti. Vi que eu não era aquilo. Para mascarar a dor, eu me mascarei. E como a gente sabe, as máscaras sempre caem.Preferi voltar a ser eu mesma, mas ainda brinco em dizer que toda mulher apaixonada vira "mulherzinha". Mas não há nada de pejorativo nisso. Devíamos querer ser mulherzinhas. Hoje muitas mulheres perderam a capacidade de se ver de verdade, de acreditar que podem e devem ser cultivadas como flores que precisam de cuidado. Para não ficar por baixo, decidiram agir como homens (como eu mesma me incluí) , e como geralmente mulher tem um requinte a mais, algumas tornaram-se uma espécie bem pior que homens cafajestes.

Lembro que quando eu era criança, a palavra "depravação" me soava como algo transcendental e longíquo, algo como Sodoma e Gomorra. Hoje, depravação é sinônimo de normalidade. Enquanto eu trabalhava em Recife, vi dois casais sentados em uma praça. Não ia prestar atenção se não fosse os quatro adolescentes trocarem de casal por pelo menos duas vezes apenas enquanto eu atravessava a praça. As duas meninas se beijavam e se pegavam enquanto os rapazes riam. Depois, cada uma delas se enroscou com um dos meninos, e trocavam de boca freneticamente, como se tudo aquilo fosse "normal". Eu parei e me assustei. A mulher que passava ao meu lado notou e disse:"isso é todo dia".

Eu continuo assustada. E não aquele susto de puritanismo, é susto real. De ter medo do futuro, feito por uma geração que foi concebida em um mundo em que os valores viraram piada. Li uma crônica do Ariano Suassuna falando das pseudo-músicas de forró que despontam no topo das paradas musicais,e que podem exemplificar bem o que tento dizer nesse post.
As músicas? "Mulher Roleira", "Dinheiro na Mão, Calcinha no chão", "Fiel à Putaria"...

Lembro que, na minha adolescência, enquanto eu sonhava com um príncipe encantado e escrevia em diários, eu experimentava sentimentos. E isso não faz tanto tempo assim. Hoje os adolescentes experimentam pessoas.

E vejo que por esse tempo, homens e mulheres procuram-se, acham-se, usam-se e descartam-se. O amor virou balela. Amar gratuitamente é sinônimo de submissão. E gente sem amor, constrói mundo sem amor. E mundo sem amor vira inferno. E é nesse inferno que todos nós nos queimaremos.

O sexo passou a ser o começo, o meio e o fim, e geralmente vem sozinho, sem relacionamento para atrapalhar. Porque a gente se acostumou a tudo que é fácil e rápido. Ninguém tem mais paciência de discutir relação, de ouvir o outro, de construir as bases. Parecemos uma manada desorientada que tem o mínimo de tempo para mostrar o máximo que temos. Daí explica-se a busca incessante por uma aparência melhor que a essência. Ninguém tem mais tempo de descobrir essência,de olhar a segunda vez. A gente se acostuma a não exigir nada disso, por medo da solidão. Simplesmente porque existem por aí milhares de pessoas que estão no mesmo (descom) passo apressado e aceitam relações fast-food. E ninguém quer ficar sozinho. Temos que entrar no ritmo. E depois, o que sobra é o vazio. E o vazio vai se difundindo,crescendo, tomando conta dos corações que não conhecem o famigerado amor.
Quando escuto em um rádio uma letra como "tapa na cara, puxão no cabelo", desligo o som(?) e fico pensando em onde foram parar aquelas músicas que para falar de sexo, usavam entrelinhas, como aquela de Roberto Carlos:

Estrelas mudam de lugar
Chegam mais perto só pra ver
E ainda brilham de manhã
Depois do nosso adormecer
E na grandeza desse instante

O amor cavalga sem saber
Que na beleza dessa hora
O sol espera pra nascer


Eu confesso que ando assustada com a falta de amor. Fico lembrando da famosa carta de São Paulo aos Coríntios, quando ele fala que o amor é gratuito. E a gente se acostumou a achar que "nada nessa vida é de graça", como diria o Zeca Baleiro, "nem o pão, nem a cachaça". Mas eu gostaria de acreditar de novo, que a gente pode fazer um caminho só de ida em matéria de amor.

Eu sei que é difícil a gente dispensar a reciprocidade,mas às vezes,é a melhor maneira de sermos melhores. Fico pensando nas vezes que consigo amar sem querer ser amada, e só me resta pouca coisa. E é nisso que a gente deve prestar atenção. Porque se eu amo desejando ser amado, caso eu não seja, vou transformar amor em ódio, o reverso da moeda. E de ódio, o mundo anda bastante satisfeito.

Para evitar tudo isso, e sabendo das limitações que temos, gostaria de pedir a todos vocês, de manter a guarda neste assunto. Não usar, não descartar, não marcar de forma negativa a vida de ninguém. Tentar olhar o outro com alguém que merece amor e respeito, que tem uma história e um coração. Acho que a gente tem o dever de tornar este bendito mundo um lugar melhor, e falo isso sem caretice nenhuma. É que ando cansada de amar de forma limitada,de não amar, de entrar na onda da reciprocidade ou nada. Não. Vamos parar de querer tanto, de desejar tanto, de sermos tão carentes, tão individuais,tão indiferentes. Comecemos um movimento de amor. E daqui a pouco, estaremos cantando como o Ivan Lins:


"O amor tem feito coisas que até mesmo Deus duvida..."