segunda-feira, 11 de agosto de 2008

"Aberta pra balanço"

Nos últimos dias a chuva caía forte em Campina. Apressada em chegar logo em casa antes que minha sombrinha resolvesse voar, eu mantinha passos firmes e retos, como se remasse contra a maré ( literalmente, a água subia...). Foi então que um buraco no asfalto me fez desviar o olhar da minha rota e olhar pro lado. E eis que vejo uma senhora, de longos cabelos brancos e completamente enxarcada pela chuva, se balançar, ludicamente, no balanço do parque que fica na pracinha perto da minha casa.

Eu parei e tentei observar mais atentamente se ela estava tentando sair e não conseguia, se ela não tinha casa ou qualquer outra explicação plausível para alguém sentir a chuva voraz a lhe estragar o cabelo, a roupa e ameaçar sua saúde com água gelada sobre o corpo, mas nada fazia muito sentido. Nem a atitude daquela senhora (ou menina?) nem minhas dúvidas lúcidas( existe dúvida lúcida?). Fiquei parada ali, olhando o balanço como se ele fosse um pêndulo a nos avisar da brevidade das coisas. Antes que minhas lágrimas caíssem por achar que aquela criança idosa estava sem razão, preferi sorrir e entender que em cada mente humana, há um mundo secreto, em que tempestades podem virar bençãos, balanços podem virar pontes, e o tempo é algo que pode parar.
Fiquei por mais alguns instantes olhando o sorriso daquela menina que, contrariando São Pedro, ousava brincar na chuva, ali, sozinha, no seu 'infinito particular'. Aquela cena ficou arquivada nas minhas memórias eternas, essas que a gente inclui no nosso mundo imaginário, e que, por alguma razão nos remete para muito além do que vemos, e que nos faz ter certeza de que a poesia existe em tudo e esse olhar para as entrelinhas faz com que a vida pareça fazer todo o sentido. Fui embora me sentindo cúmplice da felicidade daquela minha amiga infantil, e em sua homenagem cantarolei na chuva (sem o estilo de Gene Kelly) aquela música...


"Há um menino,
há um moleque
Morando sempre no meu coração
Toda vez que o adulto balança
Ele vem pra me dar a mão
Há um passado no meu presente
Um sol bem quente lá no meu quintal
Toda vez que a bruxa me assombra
O menino me dá a mão
E me fala de coisas bonitas
Que eu acredito que não deixarão de existir
Amizade, palavra, respeito
Caráter, bondade, alegria e amor
Pois não posso, não devo, não quero
Viver como toda essa gente insiste em viver
E não posso aceitar sossegado
Qualquer sacanagem ser coisa normal
Bola de meia, bola de gude
O solitário não quer solidão
Toda vez que a tristeza me alcança
O menino me dá a mão
Há um menino, há um moleque
Morando sempre no meu coração..."

2 comentários:

Lola Entre Linhas disse...

Ai, ai...Dá vontade de não fazer mais nada...apenas ficar aqui, fuçando seu blog...que texto lindo! Realmente há poesia em tudo.Mas há algumas coisas que contém em doses maiores...seu texto é repleto de poesia.

Lola Entre Linhas disse...

Ah...quanto à sua pergunta, se sou poeta: gosto muito de escrever e amo poesia. Não sei bem se o que escrevo é poesia, mas percebo poesia em tudo.A vida é poesia, é metáfora, é possibilidade...