quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

1000 calorias de sonhos

Estou num lugar longíquo e especialmente propício para pensar. Me retirei, quase que compulsoriamente, da minha rotina para que eu pudesse ter um tempo verdadeiro para pensar na minha vida e me encontrar novamente. Decidi, então, vir pra um SPA e passar alguns dias aqui, onde até sinal de internet é restrito a 400 calorias!

Nesses dias, não tenho como descrever a sensação do que é ter um mar e uma rede durante o dia inteiro, e entre um e outro ter um jardim que nos permite sentar e meditar com o barulho das ondas. Descobri muito sobre tudo. Aprendi a me alimentar melhor, a me exercitar, a conviver, a respirar, mas sobretudo, passei esses dias aqui ouvindo muitas histórias.

Gente que veio por causa de um infarto, de uma separação, de um trauma, de uma cirurgia, gente que não gosta de si mesma, gente que gosta muito de si mesma, gente que ama, gente que odeia, gente efusiva, gente antipática, gente introspectiva,gente que não tem definição, dentre as quais me incluo.

Nunca pensei que uma simples tentativa de me desintoxicar, fosse tão além. Pensei muito em postar aqui algumas das histórias que ouvi, mas receio que, além de quebrar, ainda que eu não revelasse nomes, a confiança de quem conseguiu abrir-se comigo, as histórias são aprendizados que cada pessoa absorve de maneira diferente. E, se eu contasse, certamente iria interferir no mais bonito da história de cada um, que é justamente ser contada pelo próprio autor.No que diz respeito à minha própria, eu diria que vir pra cá mudou minha vida.

O tempo que a televisão e a ansiedade por um futuro sempre tão mais próximo do que realmente é, estavam roubando não apenas meu equilíbrio mental e físico, mas sobretudo, meu discernimento em selecionar só pensamentos e ações que fazem bem à minha vida como um todo.

Quando se dá atenção às questões menos importante ou àquelas mais urgentes, perde-se a capacidade de parar e se perguntar para onde estamos sendo "levados". Não é a vida que me leva, eu que devo levá-la para o lugar que eu desejo. Um lugar seguro, feito de cada decisão que a gente faz ao longo da nossa trajetória. Decisão, não empurrão.

Aqui, sem internet, tevê , coca-cola ou filme, comecei a indagar o que me fazia feliz. E comecei a perceber toda a negligência irresponsável em achar que minha vida já estava completa, com família, emprego, marido e bicho de estimação. Acho que, quando começamos a pensar no definitivo, a angústia também passa a ser perfeita e acabada.

Comecei a pensar nos meus sonhos de criança, a prestar atenção nas coisas que eu gostava, naquilo que me dava prazer. Praticamente conversei com todas as pessoas daqui e comecei a aceitar o fato de que quase todas elas conseguiam confiar em mim, e que eu me sentia extremamente feliz em ouvi-las. O desejo de estudar o comportamento humano ressurgiu ainda com mais força em mim.

Fazer psicologia, ensinar crianças, escrever, ter uma fundação...eram sonhos que pra mim haviam sido esquecidos num passado de vestibular. Pensava que havia escolhido "Direito" e mesmo que hoje para mim isso tenha sido "Errado", azar o meu. Mas, fiquei pensando no que são 5 anos de uma nova faculdade perto de uma vida inteira pensando naquilo que poderia ter sido e não foi. Precisei de 10 anos a mais pra decidir o que realmente queria estudar. E confesso que só de pensar em estudar outra coisa que não seja Direito Civil, já me sinto aliviada.

Meus sonhos mais secretos não só cresceram aqui, mas inundaram-me de vida, "de pulso que ainda pulsa".Hoje, eu começo a sentir o que todos falam, mas que, particularmente, eu achava um tremendo clichê: os sonhos nos movem. Confesso, pela primeira vez, que eu tenho vários sonhos. E quando eu sair daqui, vou realizá-los, sem que seja necessário prometer algo. Porque, como diz o grande Raul,

Eu tenho uma porção
De coisas grandes prá conquistar
E eu não posso ficar aí parado...

E,pra terminar, gostaria de deixar registrado que meu "estalo" de sonhos veio acompanhado dessa música aqui (que, ironicamente, é da Amélie Poulain, uma moça que um dia permitiu-se ir mais além)...quem sabe não acontece com alguém aqui...


2 comentários:

Mayra disse...

Não me pergunte o porquê, Vivi, mas ao terminar de ler seu texto me arrepiei por completo.

Franco disse...

Quantos sonhos haveremos de sonhar ainda nessa vida?Muitos. Que bom!
Faz certo tempo que parei para organizar meus sonhos.( tenho vários ao mesmo tempo) e percebi que utopicamente queria abraçar o mundo e cercá-lo com meus ideais... Achava que isso era o correto, mesmo sabendo ser impossível. Mas preciso deixar espaço no mundo para que outras pessoas possam abraçar parte dele e fazer a minha “pequena” parte da melhor maneira.E cada sonho , de cada vez.
Também tenho graves conflitos com minha profissão e já pensei em fazer Direito...rs ( quem me conhece diz que eu deveria ser advogado ao invés de contador) Pior: eu também acho. Mas também pensei que, seriam mais 05 anos e tal...Mas vejo como as coisas funcionam , ou melhor, não funcionam no sistema judiciário e, provavelmente, eu enfartaria antes de terminar a faculdade! Não admito injustiça quando sob minha ótica ela foi cometida. Desisti.
Às vezes tenho vontade de morar naquela casinha, no meio do mato, com riacho, rede na varanda, SEM TELEFONE pra me perturbar. Cheiro de terra, terra molhada; vida simples e calma. Me embrear em projetos sociais e ter meu tempo livre para fazer o que realmente gosto e que não combinam em nada , ou quase nada, com essa vida urbana.Mas o mundo capitalista me mantém alerta o tempo todo e esse sonho é injustamente adiado.Não sei como você lida com assa pressão capitalista. Mas se pode, viva seus sonhos sem deixar muito para depois.
Por isso, vou vivendo dos sonhos que no momento me são possíveis.E pelo que li, seus sonhos lhe são possíveis.Vá. Siga. Cada um de cada vez. Faça sua pequena parte ser grandiosa para ti e para quem dela se servir. Abrace o que está ao seu alcance. Se cada um assim entendesse e fizesse, abraçaríamos o mundo, juntos. Uma pequena parte somada a outras infinitas partes.Assim, os sonhos ficam mais próximos, mais fáceis, animadores, possíveis.Parabéns pelos sonhos.Acho que todos eles combinam contigo.

E como dizia a grande poetisa Helena Colody:
Fio d’água
"Não quero ser o grande rio caudaloso
Que figura nos mapas.
Quero ser o cristalino fio d’água
Que canta e murmura na mata silenciosa".

Pois é, pequenos gestos e atos que nos tornam grandes e realizados.E viva os nosso sonhos!